A onze de Setembro
“- Pai, espero que compreendas… é difícil…(…)
- Sabes, pode parecer estranho! Tenho de contar com a tua ajuda nesta situação,
não é nada fácil… - justificou-se Simone (…) – Eu amo… uma mulher”, escreve
Virgílio Saraiva, o autor do romance de que falaremos esta semana.
Numa edição de 2007, da Papiro Editora,
com o ISBN 978-989-636-151-8, o autor tomarense Virgílio Saraiva deslumbra-nos
com um inusitado epílogo do seu livro “A onze de Setembro”.
A trama é densa e se termina com a assunção de
uma homossexualidade recalcada no feminino, começa com “um simples soutien, de
tonalidade creme, algo amarrotado ao fundo da cama, permitia denunciar, com um
relativo grau de certeza, uns tentadores seios completamente libertos e desnudado”.
Mas desengane-se o leitor, se pensa que nosso especialista em direito de
consumo do Município, nos traz um demoníaco livro erótico. Antes sim uma viagem
pela vida, pelas vidas, pelos tempos, dos 25 de Abril, de antes e depois, ao 11
de Setembro, apenas como marcas de caminhos, de sonhos, de frustrações. Enfim:
pedaços de uma vida de portugueses como você, como eu, como alguém com quem se
pode cruzar dentro de minutos, na corredora ou no jardim.
Dado à estampa em 2007, este livro aborda entre
outros o eterno tema da diáspora Portuguesa, que pode ser a de Tomar, numa
ante-visão de discussão sobre o que nos estão a fazer, ao País desde há um ano
e a Tomar desde há quase quinze. Há amores e desamores, encontros e perdas,
pautas de liberdade, com orquestras noutros registos, como nos convida um
interessante prefácio de Paulo Fonseca, hoje edil de aureana, ao tempo
representante do poder na scalabis dos toiros.
Mas o que me interessa relevar hoje, além do
interesse da leitura integral, única e envolvente, é o epílogo com que começa
esta crónica. É que num tempo em que as crises nos atacam por todos os lados,
também a assunção das homossexualidades, como caminho de respeito pelas
diferenças e opções legítimas e privadas dos cidadãos, não tardará a estar, de novo,
em causa. Moralismos e atavismos à parte, o diferente começa de novo a
ser olhado de soslaio. E isso tem de ser combatido: de caras e sem tibiezas!
“Mas, meu Deus?! – em pânico. [O Pai] –
Mas porquê?! - Deus não responde! A verdade é que nos amamos, gostamos
uma da outra, (…) [responde Simone]. Deus não responde. Nem condena. Não
pode condenar, porque não existindo ou mesmo que o pudesse, não o faria
decerto. Assim está nas escrituras: dar a outra face. Daríamos nós?
Toleraríamos nós se um amigo ou uma amiga próxima se assumisse, mesmo numa
terra pequena como Tomar, como homossexual. Perceberíamos que essa opção, fruto
da liberdade, em que todos nascemos, a qual condicionamos apenas por
aculturação, que essa opção, era ela própria sinal que haveria esperança para a
nossa terra?
Aguardemos…
Obrigado pelo desassossego, Virgílio.