As últimas semanas tem sido vividas com uma atividade
cultural de monta, aliás na senda daquela que é sempre a oportunidade dada pelo
“início do ano” tomarense, ou seja por volta daquele que era o começo do ano na
idade média, marcado pelo início de Março. Por isso se assume que a data da
fundação do Castelo Templário, por D.Gualdim Pais, terceiro mestre da Ordem em
Portugal, é o primeiro dia do mês em que começa a Primavera, a renovação, no
fundo que marca o renascimento. Tal como a Universidade de Coimbra, se assume
ter começado a 1 de março de 1290, com a assinatura, por D.Dinis, do seu famoso
Scientiae thesaurus mirabilis.
Dois momentos em particular há que reter e, os quais podem ainda
durante este mês de março ser por todos visitados: a exposição coletiva que se
encontra na Moagem – no complexo cultural da Levada de Tomar e a exposição
individual do Arquiteto Souto Moura no Convento de Cristo.
Da exposição coletiva, intitulada “13 Luas, 2017”, junta 10
artistas, alguns dos quais tomarenses, alguns estrangeiros residentes na região
e que conta com a apresentação de originais. Aqui a pintura é a rainha, numa
diversa mistura de técnicas, mas onde o trabalho de outros materiais, como o
couro, através de um artista de Alcanena, também tem presença.
Os artistas presentes são Antero Guerra, Carlos Vicente,
Claire O’Hea, João Alfaro, João Carvalho, Luís Filipe Brito, Luís Sá, Luís
Veiga, Sam Abercromby e Saúl Roque Gameiro. A quase completa metamorfagem que muitas
peças expostas fazem com a arte industrial que é a antiga Moagem, ainda com
muitas das suas máquinas, faz desta visita um desafio aos sentidos
interpretativos e fazendo jus ao nosso passado, transforma o deambular pelos
cinco pisos do edifício, numa tarde de revisitação, num renascimento, não só
lunar, como e especialmente solar.
De igual forma, numa subida ao Convento de Cristo, o mais do
que conhecido e galardoado Arquiteto portuense, Souto Moura, dá-nos a conhecer
parte da sua longa e premiada obra, numa exposição intitulada “Eduardo Souto de
Moura: Continuidade”. Com curadoria de André Campos e Sérgio Koch, a exposição
– que apresenta sete projetos em formato de maquete e uma série de oito vídeos
originais da autoria do realizador Takashi Sugimoto. Segundo estes, a
arquitetura de Souto de Moura “procura a racionalidade na disciplina,
claramente influenciada por Aldo Rossi e os seus princípios de que as
preexistências, a história da arquitetura, a tradição da cidade europeia e a
ideia de monumento são o ponto de partida para evolução da disciplina”. Somos
testemunhas que a exposição marca também, por estas semanas o renascimento,
anual, do nosso espírito e, ao invocar o lugar, transporta-nos por ele, num
esvoaçar de desejo intrépido de olhar e ver.
Assim, eis que chegado a algo que não devemos continuar a
obliterar, como seja um novo olhar que devemos começar a ter pela nossa Praça,
hoje da República e durante séculos de D.Manuel.
Aí se encontra, desde julho de 1940, uma Estátua do mestre
fundador do Castelo, D.Gualdim Pais, numa obra do escultor Macário Dinis, tendo
a estátua sido erigida por subscrição pública e por iniciativa da Associação
dos Amigos do Monumento a D. Gualdim Pais ,que teve em Vieira Guimarães um dos
principais impulsionadores.
Tal como tudo em Tomar, com o seu próprio ritmo, demorou 45
anos a ser concretizada e, inicialmente prevista para ser colocada junto ao
Castelo que fundou, na entrada da cidade que criou – sim porque a Tomar até ao
século XIV era quase só e apenas intramuros, a denominada Vila de Cima, viria
pelo Estado Novo a ser decidida de colocar na Praça D.Manuel, há pouco anos
rebatizada da República.
Hoje, passados quase 80 anos da sua colocação na Praça, urge
voltar a discutir a sua localização. Nascido que fui no Bairro das Flores,
contíguo por isso à Praça, toda a minha vida vi a Estátua como parte do lugar.
Hoje, com outro mundo e outros olhos, olho para ela e
compreendo a estranheza da sua presença.
Talvez por a Praça ter sido refuncionalizada, de lá retiradas
quase totalmente as viaturas, de onde deixou de se fazer o mercado semanal. Talvez
por ter ganho a vida de ser parte da nossa fruição e não o centro do nosso
dia-a-dia, que foi durante séculos. Talvez por D.Gualdim Pais nada ter a ver
com a frontaria do gótico flamejante, vulgo Manuelino, presente na Igreja de
S.João Baptista, ou na magnitude das arcadas do Paço de D. Manuel, construído
de raiz para ser a Casa do Município no sec.XVI.
Talvez por tudo isso, ou talvez apenas por não ser aquele o
ESPÍRITO do LUGAR.
Eu, pessoalmente gostava de ter a Praça liberta e o nosso
fundador no lugar que é dele por direito. Acaso não temos o Infante D.Henrique
colocado no caminho entre a vila de cima e a vila de baixo, a que ele
efetivamente deu vida e sentido, no início do sec.XV? Pois decididamente, temos
uma década para o fazer. Começamos já? Ou vamos demorar outros 45 anos, como se
demorou a fazer e inaugurar a Estátua?
(Filme realizado por ocasião da sua inauguração)
Capa do Jornal "O Templário" |