(Artigo de opinião, )
Perto das 14H30 do dia 7 de dezembro de 2010, a cidade de
Tomar viria a ser atingida pelo Tornado mais extenso em área – 54Km e em
largura – até 350m, que alguma vez atingiu Portugal.
Quem como eu teve de lidar com as consequências de tal
fenómeno extremo, apesar de comum em Portugal – com uma média de 6,5 tornados
por ano no decurso da primeira década deste século (LEITÃO, 2017), não esquece
quer as circunstâncias da reposição da normalidade da vida das populações, que
demorou quase uma semana, quer as debilidades dos sistemas – de proteção civil
e políticos, de liderem com tal.
Foi uma situação que nenhum responsável político de Proteção
Civil Municipal, quererá ter de lidar no futuro, pois honestamente não há
sistemas de proteção civil preparados para tais eventualidades, totalmente imprevisíveis.
A dimensão do fenómeno que atingiu Tomar, com ventos que
terão oscilado entre os 254-300 Km/h, que se propagou a uma velocidade de mais
de 78 km/h no solo e com uma velocidade de sucção na vertical dentro do cone de
quase 29 Km/h, tornava impossível qualquer ser humano resistir ou fugir quando
diretamente apanhado por ele. Felizmente não houve uma única vítima mortal.
Este Tornado, tendo sido o maior em extensão, foi “apenas” o
segundo maior de sempre em velocidade da rajada, uma vez que o Tornado de
Alcanena de dois anos antes (9 de abril de 2008), havia atingido velocidades
entre os 300-342 Km/h e uma sucção na vertical dentro do cone (de apenas 100
metros de diâmetro) de 46 Km/h, mas apenas havia percorrido uma extensão de
cerca de 20 km.
Presidente e vereadores de então envolvidos, em reunião de coordenação e gestão do Plano Municipal de Emergência
Como todos estamos lembrados a mais significativa extensão de danos e consequências humanas – felizmente apenas de feridos (43 no total, dos quais 36 no nosso Concelho, sendo 19 crianças), deu-se no Jardim de Infância João de Deus da Rua de Leiria, na Ponte da Vala, no Carrascal, Pesqueira, Venda Nova, Casal Novo e Ganados.
Estimámos na altura que tínhamos tido no Concelho mais de 9
milhões€ de prejuízos, dos quais mais de 1 milhão em infraestruturas públicas.
Mais de 200 operacionais de todo o Distrito de Santarém ocorreram à emergência,
tendo sido ativado o Plano Municipal de Emergência então existente e declarado
o ESTADO de ALERTA VERMELHO, logo às 15H00, o qual se manteve durante 45 horas,
até ao meio dia de dia 9/12, altura em que se considerou que a grande
emergência havia passado, com a reposição mínima das condições de vida das
populações afetadas. Mesmo assim durante, mais 4 dias, até ao meio dia de
13/12, manteve-se um alerta AZUL – o qual hoje se chamaria de VERDE, pois as
operações de limpeza e apoio às populações prosseguiram.
Assim os primeiros dois dias foram os mais críticos, mas
durante uma inteira semana, não houve mãos a medir e logo na manhã do dia
seguinte afluíram a Tomar inúmeros voluntários, do Concelho e fora dele, que
colaboraram com os serviços municipais de proteção civil e as juntas de
freguesia no apoio direto às populações, na limpeza das dezenas de casas
destelhadas e em parte destruídas. Foi montado durante esses dias, em
permanência para todos os operacionais, uma “cantina” na então Estalagem de
Santa Iria, no Mouchão.
Se a resposta dos cidadãos foi significativa, a resposta do
Governo foi também rápida, uma vez que todos os prejuízos públicos foram
cobertos pelo fundo de emergência municipal, de imediato ativado e, bem assim,
logo no dia útil seguinte as principais companhias de seguros já estavam a
receber os seus segurados no Hotel dos Templários para rápido acordo
indemnizatório dos carros e casas danificados ou perdidos.
Foi apenas necessário proceder ao realojamento de uma
família, durante duas noites e o empenho dos bombeiros quer no apoio direto às
primeiras populações afetadas – especialmente as mais vulneráveis – da Ponte da
Vala, Carrascal e Pesqueira, foi exemplar e permitiu levantar as necessidades
emergentes. Igualmente notável foi o esforço de limpeza das vias e o
levantamento prévio das casas afetadas pelos respetivos serviços de higiene
urbana e de obras municipais, que com rapidez permitiu desativar quer o ESTADO
de ALERTA VERMELHO em menos de 48 horas, quer em pouco mais de uma semana ter
uma estimativa concreta dos prejuízos.
Seis dias depois, a nível de reposição da necessária
normalidade da vida no Concelho – âmbito de atuação da proteção civil, tudo
estava terminado. Mas as grandes “lutas” ainda estavam para vir, pois desde a criação
e grupos ad-hoc de recolha de donativos, desenquadrados do Plano de Emergência –
onde era a Cruz Vermelha a responsável pela criação e gestão de conta exclusiva
para o efeito, até à tentativa de passar a responsabilidade de compensações de
índole privada para o Governo da altura e de desvalorização do papel, então
relevante tido quer pela Governadora Civil do Distrito, quer pela Deputada
residente em Tomar, por óbvia inveja mesquinha de razão partidária, houve de
tudo. Mas isso será razão de abordagem noutra ocasião.
Como curiosidades interessantes temos que a primeira casa a
ser afetada no Concelho de Tomar, na Murteira (na freguesia da Madalena) era propriedade
da atual Presidente da Junta de Freguesia – Luisa Henriques. Entre as dezenas
de voluntários que então foram ajudar a limpar lixo e telhas para as casas,
especialmente dos agregados mais debilitados da Ponte da Vala, Carrascal e
Pesqueira, contavam-se a então deputada e hoje Presidente da Câmara de Tomar –
Anabela Freitas e o atual vice-presidente Hugo Cristóvão (conforme foto então
publicada no Boletim oficial da Proteção Civil (nº4/12-2011).
A Governadora Civil de então, que foi crucial para a tramitação mais rápida dos apoios operacionais e depois financeiros para o Município, foi a última na função – os Governos Civis viriam a ser extintos menos de um ano depois pelo Governo PSD/CDS de Passos Coelho e chamava-se Sónia Sanfona, hoje Presidente da Câmara Municipal de Alpiarça. Como última curiosidade, a conta oficial de receção de donativos, titulada pela Cruz Vermelha, nunca viria a ser utilizada pelas duas presidências do PSD – Corvelo de Sousa e Carlos Carrão e só já em 2015, a presidência da Câmara, soube da continuidade da existência de alguns milhares de euros aí disponíveis.
Hoje já existe um novo Plano Municipal de Emergência (2018/2020)
e, talvez se de novo o Concelho fosse fustigado, as aprendizagens entretanto
tidas pela população, mas especialmente pelos atores políticos locais, bem como
a consciencialização de que a proteção civil é uma rede colaborativa entre
diferentes níveis, que de forma genérica cumpriram bem a sua missão, evitaria
que se voltasse a assistir a um presidente de junta de então aos gritos num
canal de TV (rodeado de bombeiros de diversos pontos do Distrito), afirmando
que “ainda não tinha visto a proteção civil…”. Então, como agora, uma carroça
vazia fazia e faz sempre um enorme ruído, mas não deixa de ir vazia…
Luis Ferreira – Vereador da Proteção Civil (2010-11)
Leitão,
Paula 2017. Relatório DivMV 05/2017 – Tornados reportados em Portugal 2001 a
2010. IPMA, disponível em https://www.ipma.pt/resources.www/docs/publicacoes.site/2017_PLeitao_tornados_2001-2010.pdf
Fotos retirados do Boletim da Proteção Civil de Tomar
(DEZ2011), disponível em https://protegetomar.files.wordpress.com/2011/12/boletim-protegetomar-4.pdf