Ansiedade, insónias, pesadelos, isolamento, negativismo, arritmia, falta de esperança, instabilidade emocional, agressividade, são alguns dos mais comuns sintomas do “MEDO”, o vírus que ataca e controla as nossas mentes.
Neste momento de total incerteza que o COVID 19 veio instalar, torna-se impreterível partilharmos as nossas experiências de vida pessoal e profissional numa vontade de tentar desmistificar este nosso inimigo invisível. Vou tentar, de uma breve forma, relatar a minha experiência de como convivo nestes últimos 25 anos com este “antigo vírus”, os seus sintomas e a forma como luto com ele diariamente.
Iniciei a minha vida profissional, em 1994, num contexto familiar, realidade que se mantém até ao presente. Com o passar dos anos e com a diversidade de áreas de negócio onde me fui envolvendo ganhei uma dificuldade imensa em separar a dimensão pessoal da profissional. Muitos do meus grandes amigos conheci-os em contexto profissional, outros grandes amigos acabaram por se tornar os meus atuais sócios.
Comecei na área de produção de publicidade, uma indústria muito instável – gestores de marcas, em alturas que o ciclo económico ou do produto decrescem, cortam logo na rubrica “comunicação”. Começamos todos os anos com bastantes clientes, mas sem projetos concretos ou contratos garantidos, contexto ideal para que a ansiedade, comece a manifestar-se. Nos últimos anos fizemos ainda uma incursão na indústria de eventos, restauração e turismo – outra área bastante volátil.
Em 20 anos passei por vários momentos difíceis, uns que resultaram de ciclos económicos, outros de mudanças de paradigmas na indústria e, naturalmente, alguns de foro pessoal.
Em 2001 quando o mundo entrava em recessão das dot.com e após os ataques de 11 de setembro relembro-me de uma conversa com o meu pai, com quem tenho o privilégio de trabalhar, e confessei-lhe, a chorar, o meu estado de total pânico com o que se estava a passar no mercado, temia o pior – as marcas cancelaram todos os investimentos em comunicação, o nosso principal mercado tinha-se esgotado por mudanças tecnológicas, tínhamos acabado de fazer um grande investimento em novas instalações e em equipamento semi-industrial, receei o pior, na minha cabeça a falência seria o caminho mais certo.
No fim desse meu momento de ansiedade, o meu pai, com imensa calma diz-me, “vou começar a construir a minha casa” – achei um completo ato de irresponsabilidade; como iríamos conseguir ultrapassar tudo aquilo? Quando eu mais iria precisar do apoio do meu pai, a decisão dele era construir uma casa…
Passei dias sem dormir, o pânico apoderou se de mim, de tal forma, que até o hábito semanal de comprar o jornal evitei, para poupar 200 escudos. Tudo isto obrigou-nos a repensar o nosso negócio e a verdade é que passados dois anos, com muita calma e “enjaulando” o medo, pânico e terror que insistia em aparecer, estávamos mais fortes e a trabalhar com duas das maiores marcas em ativação, eventos e shopper marketing.
Desde essa altura geri muitas adversidades, todas com receio, em algumas delas esse receio conquistou os meus pensamentos, as minha ações.
Em 2016 numa dessas adversidades e depois de estar 3 meses com um “burnout” percebo que nunca vou deixar de ter medo, e isso não é necessariamente mau, não posso é permitir que ele usurpe a minha mente e que condicione o meu futuro. O medo de falhar com as pessoas, desde a minha família até às que dependem de mim profissionalmente, deu-me forças e ferramentas e hoje percebo perfeitamente a atitude do meu pai em 2001.
Procurei entretanto encontrar pontos de equilíbrio, descobri terapias que por vezes são óbvias – o desporto, a música, valorizar coisas que parecem garantidas mas que não são. Afastei-me de pessoas negativas, deixei de ler notícias cáusticas, mudei de alimentação, reduzi drasticamente o café, e acredito que mesmo que no dia de hoje vemos um futuro próximo demasiado “turvo”, ele existe e está cheio de oportunidades – podem é ser diferentes das que esperávamos.
Atualmente no nosso grupo de empresas temos quase 150 pessoas em lay-off e centenas que dependem também de nós, praticamente sem atividade. Estimamos um impacto de 80% nas receitas no primeiro semestre pois praticamente todos os nossos negócios dependem de “gathering people”,a coisa mais utópica no presente. Estamos portanto, no contexto perfeito para que o “antigo vírus”, amplificado desta vez pelo novo coronavírus, se apodere da minha mente – há dias que este ganha uma dimensão cada vez maior.
Ao longo dos últimos 20 anos experimentei de tudo para o destruir – psicólogos, hipnose, psiquiatras, yoga, coaching, xamanismo, iridologia, acupuntura – nenhuma destas experiências me impediu de o sentir, mas todas elas me protegeram e ajudaram-me a perceber que o Medo não é malévolo. Bem gerido, o medo deixa-nos atentos, em estado de alerta, surge quando nos sentimos ameaçados fisicamente ou psicologicamente, é uma resposta natural do nosso organismo para nos tornar vigilantes ao que está ao nosso redor.
Um dos primeiros diagnósticos feitos por psicólogos concluiu que era muito ansioso, nada que não soubesse, pois passava os dias a fazer exercícios mentais de catastrofização; depois de explicar ao psicólogo como era o meu mercado profissional, um deles fez me a analogia “pedir a um ansioso que trabalhe no seu mercado com essa instabilidade, é o mesmo que pedir a um alcoólico que trabalhe num bar”.
Esta é apenas parte da minha história, partilho-a porque acredito genuinamente que o Coronavírus está a afetar maioritariamente o nosso estado emocional, vejo pessoas a serem vítimas de bullying porque trabalham em ambientes de maior risco de contágio, famílias com medo de se abraçarem, pessoas a aproveitarem-se da realidade que vivemos, vejo pacientes com outras doenças que não vão aos hospitais arriscando a sua própria vida, isto é a prova que o pavor já tomou conta da consciência de muitos de nós.
Ao longo dos últimos anos falei abertamente das minhas fragilidades com amigos, arranco facilmente comentários como “nunca imaginei que sofresses disso” mas também oiço muitas vezes “sofro imenso de ataques de ansiedade” ou “faço terapia desde que me senti sem chão”, acredito que falar das nossas fragilidades torna-nos mais fortes e cria maior cumplicidade e empatia, além de ser uma ótima terapia, também sei que em geral as pessoas têm medo de se expor porque a sociedade é cruel, percebo igualmente que o estou a fazer como nunca fiz, mas se for para ajudar alguém a arranjar estratégias para impedir que o medo se apodere da sua mente, já valeu a pena.
Não querendo menosprezar o impacto na saúde pulmonar que esta pandemia está a provocar, parece-me que o maior impacto é na nossa saúde mental.
Reafirmo, o “MEDO” faz parte da nossa vida, e como a generalidade de tudo o que fazemos e sentimos deve ser gerido com equilíbrio, não pode ser ele a gerir-nos .
O Medo não se pode apoderar da nossa mente.
O Medo não pode hipotecar o nosso futuro.
O Medo não nos pode impedir de sonhar.
O Medo não impede a morte, impede-nos de VIVER.