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6.11.19

A outra vigarice: a do "pensamento positivo"

Não, não é novidade nenhuma.
A ciência trata de factos, não de crenças.
Trata de evidências, não de "energias".
Os Humanos têm de se fazer à vida e não ficarem à espera de qualquer "intervenção" divina ou a fazerem tanta "força" no seu pensamento, que produzam energia suficiente para os moverem de um lado para o outro.
Não: isso não existe. 
Têm mesmo de levantar o rabinho e tratarem da sua vida...

Mas há dúvida?
Leia uma abordagem sobre o assunto:

(Artigo original aqui)



O Culto do Pensamento Positivo…


Existe toda uma indústria criada à volta do pensamento positivo. Programação neuro-linguística, o “coaching motivacional”, seminários de auto-ajuda, a subversão dos princípios do Mindfulness. Oprah, Deepak Chopra, Gustavo Santos e centenas de outros intelectualóides, apresentadores de TV, coaches e gurus auto-proclamados fizeram a sua vida baseados neste conceito. Até na medicina, não faltam profissionais de saúde ignorantes a venderem a ideia que, pensado positivo, é possível ajudar a combater ou mesmo reverter doenças crónicas e outras fatais, como o cancro. Se pensares positivo, resultados positivos vão aparecer…simples, não é?
Infelizmente, isto não parece ser mais do que pensamento mágico. Da ideia que o campo “espiritual” e emocional podem influenciar o mundo físico. A ideia da mente sobre a matéria, a crença na lei da atração…se pensares positivo, coisas boas vão acontecer. Não passa da perpetuação da ilusão de controlo sobre o acaso.
Obviamente que seria espetacular pensar em alguma coisa com muita “força” e que isso aumentasse a probabilidade dessa coisa acontecer. O problema é que não existe absolutamente nenhuma evidência científica que apoie essas ideias. Sejam vigaristas ou sinceros, os autores de livros de auto-ajuda lucram rios de dinheiro com este mantra. Não faltam livros de auto-ajuda para ensinar a ganhar dinheiro, encontrar o amor da sua vida, melhorar as suas capacidades cognitivas e, óbvio, curar doenças como o cancro.
E o problema, é que o mantra do pensamento positivo não parece ser apenas inútil, mas contraproducente. Por exemplo, num estudo, dividido em três grupos, fizeram um grupo de alunos pensar em obter uma boa nota num próximo exame (pensamento positivo), outro grupo pensar no processo de estudar e fazer o exame (pensamento orientado para a função), e outro não fizeram qualquer intervenção. Os alunos que pensaram no processo de estudar tiveram melhores notas que o grupo sem intervenção. E o grupo que pensou em obter uma boa nota (pensamento positivo) teve PIOR resultado que o grupo sem qualquer intervenção. A piada é que o pensamento positivo, não é apenas inútil…é um desperdício de tempo e esforço que leva a pior resultados que a ausência de intervenção.
Agora, focar-se na tarefa, parece ser positivo. Leva à ação e isso tem bons resultados. É a ação, o esforço da pessoa (neste caso, estudar) que tem o resultado positivo.

A vantagem do pensamento “negativo”

Por incrível que parece, parece existir benefícios de uma perspetiva pessimista. Os empreendedores pessimistas ganham mais dinheiro (artigo e artigo), têm uma comunicação mais eficaz (artigo e artigo), parecem ser mais empáticos e generosos e aparentam favorecer uma maior justiça social (artigo). E as pessoas pessimistas até poderão viver mais tempo, já que tendem a preocupar-se mais com a saúde e procurar ajuda mais cedo (artigoartigoartigoartigo). Além disso, excesso de otimismo relativamente a uma relação amorosa parece ser contraproducente para o sucesso dessa relação. E pode levar a mais desilusões na vida devido a uma fraca gestão de expetativas.
Aparentemente, a preocupação é útil, pelo menos até certo ponto. O otimismo excessivo pode tornar-nos descuidados e pouco preparados para o fracasso.
Não só isso, como o pensamento “positivo” também pode complicar a morte de doentes com cancro terminal. Primeiro, já falamos da procura de tratamentos fora da medicina convencional que apenas serve para enterrar dinheiro sem qualquer benefício, como as famosas clínicas da Alemanha. Depois, achar que se consegue fugir de uma doença terminal apenas tem um resultado: a profunda decepção. Também se verifica que indivíduos envolvidos no movimento do pensamento positivo podem atrasar o início de tratamentos eficazes, baseados em evidências e dar preferência às chamadas práticas de “manifestação”, na esperança de curar doenças. Infelizmente, essa abordagem geralmente leva à tragédia, como já falamos.
Concluindo…não existe qualquer relação entre o pensamento positivo, o “bem-estar emocional” e a mortalidade dos doentes terminais. Não atrasa o inevitável. Pior…é uma falta de respeito pela pessoa que está a sofrer impor-lhe, seja por médicos ou familiares, o “pensamento positivo”, que a pessoa tem que “permanecer positiva” e “corajosa”. Cada um deve ter o direito de lidar com a doença como achar melhor.

Concluindo

Existe todo um culto, toda uma indústria do pensamento positivo, fundada em pés de barro e que apenas serve para alimentar uma série de parasitas da sociedade. Além disso, este culto é mais uma porta aberta para os doentes e moribundos acudirem à pseudociência e todas as suas “curas” e tratamentos “milagrosos” que não são oferecidos pela medicina convencional. É mais uma porta aberta para os fracos, pobres, necessitados e deprimidos serem explorados pelos gurus, coaches do pensamento positivo, que prometem mudanças de vida radical mudando apenas o “mindset” e apregoando a lei da atração.
O dinheiro, o amor e a saúde não irão aparecer apenas porque tem um pensamento positivo sobre o resultado final e não se aplicou no processo. Quer ter sucesso? Faça uma avaliação crua e fria da realidade e concentre as suas energias nos processos de mudança. Opte pelo “pessimismo defensivo“, em que o esforço é orientado para a mudança. Não só será mais bem sucedido (artigo e artigo) , eventualmente ainda viverá mais tempo.
Pensamentos positivos não atraem nada, porque o Universo não tem desígnio, não tem vontades, simplesmente não quer saber.


[Comentário retirado do blog do autor]
O pico do fenómeno do pensamento positivo foi o livro "O segredo". Nessa altura havia pessoas a colocar na secretária do trabalho e no frigorifico fotografias das coisas que queriam obter como por exemplo carros ou casas extravagantes. Não conheço nenhuma pessoa que tenha conseguido (relato anedótico sem valor de prova científica).

Do ponto de vista da evolução, a tendência é sermos maioritariamente pessimistas, os nossos antepassados demasiado optimistas foram todos rapidamente "podados" da arvore genealógica por ursos, lobos, linces, penhascos, correntes fortes, bagas venenosas e outros factores "naturais".

A questão que me coloco é se é possível obter o sucesso do pessimismo sem o sofrimento e angústia que este causa, ou seja, se podemos evitar o sofrimento por antecipação que normalmente acompanha o pessimismo. Quando praticamos o pensamento orientado para a função (ou para o processo) sofremos tanto ou mais do que quando estamos realmente a executar a função ou o processo, já dizia o grande filósofo do final do Sec. XX, Steven Seagal, "A antecipação da morte é pior que a morte em si".