30.11.16

Os Homens também choram

A Assembleia Municipal de Tomar, na sua última reunião realizada no passado dia 18 de novembro, aprovou por esmagadora maioria, apenas coma abstenção do PS, a moção por mim apresentada, referente ao reconhecimento da integração do apoio às vítimas de violência doméstica, no contexto das políticas municipais.


A moção levantou ainda a hipótese, a ser estudada, de se poder instalar em Tomar um “Gabinete de Apoio à Vítima”, eventualmente em parceria com a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), uma vez que os únicos gabinetes existentes na região centro se encontram em Santarém e em Leiria. 


 Longe vão os tempos em que o preconceito sintetizado do “entre marido e mulher, ninguém mete a colher”, numa assunção de que o que se passava no contexto da vida comum e privada entre duas pessoas, era do exclusivo foro privado, assunção jurídica cada vez mais ultrapassada, uma vez que os crimes associados à violência doméstica são hoje crimes públicos, cabendo a qualquer cidadão alertar as autoridades policiais e judiciais para o conhecimento de factos que possam desencadear a respetiva investigação, não estando apenas dependentes de queixa apresentada pela vítima.

Esta evolução da sociedade, na perceção e desenvolvimento jurídico até da sua extensão, para lá da fronteira do casal, antecipando a eventual existência de crimes de violência doméstica ao namoro e prolongando-o para depois do fim das relações e separação efetiva dos namorados ou casais, visou dar proteção jurídica aos cidadãos (mulheres e homens) que, de alguma forma, pelas relações conjuntas que vivem ou viveram, se acham ou acharam em risco – físico ou psicológico.

Cada vez mais hoje, fruto da felizmente cada vez maior presença da mulher em profissões e funções de liderança e poder na sociedade, demonstrando que o anátema de séculos da sua subjugação ao homem, por razões sociais, políticas e muitas das vezes religiosas, estava não só errado, como prejudicava a sociedade no seu todo.

Assim, a adaptação a esse novo papel da mulher, concretizado apenas em Portugal há uma geração, não foi isento do surgimento cada vez mais de violência doméstica exercida sobre os homens, mais 15% só nos últimos dois anos, segundo dados e estudos da APAV, no contexto das relações de cada vez maior desnivelamento de poder existente entre as suas companheiras e eles próprios. 

Quando falamos de poder, falamos de riqueza, de remunerações, de contextos familiares em que o papel do homem, por questões de nascimento ou profissão detida, não segue o “padrão” tradicional. Hoje são cada vez mais os casos em que é a mulher que ganha mais, que tem mais riqueza e protagonismo social, que exerce profissões “mais nobres” e isso, além da detenção natural do seu insubstituível papel na procriação, leva a que cada vez mais homens se afirmem e se queixem de violência doméstica, isto apesar da “vergonha” que têm ao fazê-lo, ainda segundo estudo realizado pela APAV.

Este fenómeno da violência das mulheres sobre os homens, essencialmente de cariz psicológico, em permanente aumento estatístico, não escamoteia a ainda preponderante existência de violência contra as mulheres, especialmente de cariz físico, com sevícias que infelizmente em muitos casos acabam por ser mortais. A violência não tem assim, cada vez mais, um único sentido e se a exercida sobre as mulheres é essencialmente física, aquela a que os homens estão sujeitos é de cariz essencialmente psicológico e de condicionamento social.

Estranha-se assim, que a bancada do PS na assembleia municipal de Tomar, não tenha com o seu voto favorável acompanhado o esforço proposto de reconhecimento desta importante matéria, também no seio do Município. Diria mesmo, como dirigente concelhio e distrital que sou desse partido, ser absolutamente lamentável que em Tomar, em pleno sec.XXI, um Partido como o PS, através dos seus autarcas, não consiga separar o trigo do joio, deixando de estar focado na árvore, vendo a floresta e dessa forma, não tenha conseguido valorizar o papel da vítima, independentemente do sexo de nascimento. 

 Ao fazê-lo da forma e no momento em que o fez, o PS tornou-se conivente com uma estratégia de vitimização, encetada desde há largos meses pela sua presidente, como se tal fosse necessário para valorizar o já longo e profundo trabalho realizado, especialmente nos dois primeiros anos da sua gestão autárquica. Ele há silêncios na vida pública e fugas à realidade que, parecendo úteis a curto prazo, acabam por ser mortais a mais longo prazo. Em política não pode, não deve, valer tudo e tal como diz o povo : “tão ladrão é o que vai à vinha buscar as uvas, como aquele que fica na estrada a ver”.

A bem de todas as vítimas de violência doméstica, esperemos que o bom senso possa imperar e que os nossos autarcas municipais, agora rejuvenescidos com mais arejados protagonistas, saibam fazer o caminho justo para a instalação em Tomar, de um Gabinete de Apoio à Vítima, mulheres e homens dele necessitados.

Sim, porque apesar de muitas vezes isso ser mal visto e para os próprios constituir ainda uma vergonha, os homens também choram. E muito!