16.2.20

Porque motivo ocorreu o divórcio entre a filosofia e a politicas ambientais?

“Os filósofos do iluminismo serviram-se de um preceito simples, mas aparentemente muito poderoso: Quanto mais capazes formos de usar a razão para entendermos o mundo e para nos entendermos a nós próprios, mas capazes seremos de moldar a história à nossa medida. Para controlarmos o futuro, é necessário que nos libertemos dos hábitos e preconceitos do passado.” 
Anthony Giddens


Ter-se-á prendido com a dicotomia entre Ética Ambiental Antropocêntrica vs Ética Ambiental não Antropocêntrica? Que se terá propagado na politica, através da sustentabilidade forte vs sustentabilidade fraca e no direito do ambiente em concepção ampla vs concepção restrita ?


Aparentemente, será nesta dicotomia, datada e bafienta, que reside a principal incongruência e problema das “éticas clássicas”.

O desenvolvimento do conhecimento científico, permitiu que, de ciências, como a física, química, biologia e geologia, tenha emergido a Ecologia, que reúne a visão e ferramentas para ilustrar as complexas relações de intra e interdependência nos meios bióticos e abióticos. Esta ilustração terá culminado na cada vez menos controversa hipótese holística e sistémica de Gaia, enunciada por Lovelock.

De acordo com esta hipótese, fica claro que o homem, independentemente da sua distintiva consciência, é parte do todo, influenciando e sendo influenciado pelo meio.

Desta perspectiva, deveria ser evidente que o homem não está acima, ou a baixo da natureza. Mas sim, que é parte integrante. Esta visão, deveria por si própria, eliminar a dicotomia. Se o desenvolvimento for impactante, será, mais tarde ou mais cedo, de uma forma ou de outra, impactado. Tome-se como exemplo o impacte das alterações climáticas na economia mundial, a mortandade (de vidas humanas e não humanas) por problemas de poluição hoje presente em todos os ecossistemas, os custos da descontaminação de antigas explorações mineiras, ou os custos de paragens/reduções na pesca de stoks sobre-explorados.

Por que motivo subsiste esta dicotomia e divórcio, quando, a integração do homem no sistema Terra está definida? Não é evidente que esta dicotomia não existe e se trata de uma ilusão ?

Tal como Aldo Leopold teorizou: "Uma coisa está certa se preservar a integridade, estabilidade e beleza da comunidade biótica. Está errada se não o fizer"



PENSEMOS...
Contributo do Doutor Paulo Magalhães

«As ciências demonstraram que o que está em causa não é "salvar o planeta", mas sim assegurar a manutenção de um estado favorável do Sistema Terrestre para a humanidade. 

Isso significa que um planeta fora desse estado favorável, não serve como nossa "Casa Comum". A realidade é que nosso planeta não é apenas uma área geográfica com 510 milhões de km2. 

Se todos os planetas possuem uma área geográfica, apenas a Terra possui um sistema intrinsecamente acoplado ao planeta físico, capaz de sustentar a vida tal como a conhecemos. 

Do ponto de vista jurídico, o planeta possui apenas uma existência como entidade territorial. Esta visão unidimensional exclui a expressão mais notável e vital da natureza - o funcionamento do Sistema da Terrestre como o “software” que suporta a vida. 

O Sistema Terrestre é um bem uno, global e intangível, que não encontra amparo na rigidez do atual ordenamento jurídico. O conhecimento científico já identificou os indicadores que determinam o estado deste Sistema, os chamados “Limites do Planeta”, que definem as balizas que não devemos transgredir para manter o Sistema da Terrestre dentro do Espaço de Operação Segura para a Humanidade. 

Este espaço qualitativo e quantitativo de segurança é intangível e não-territorial, e constitui o nosso verdadeiro Global Common existente no interior e além de todas as fronteiras. Do seu não reconhecimento pelo Direito Internacional, resulta a sua invisibilidade no seio da comunidade das nações e dos povos. A sua inexistência jurídica autoriza, pois, o seu uso desregulado e a consequente tragédia do nosso bem comum global, reduzido à categoria de “externalidade”.»


in Resumo da Tese de Doutoramento em Ecologia Humana - Universidade Nova de Lisboa - Novembro da 2017